O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil tem apresentado crescimento nos últimos anos, muitas vezes enaltecido como sinal claro de progresso econômico. No entanto, ao analisar de forma crítica os fatores que impulsionam esse avanço, é preciso refletir: esse crescimento é sustentável e inclusivo? Ou estamos diante de um cenário artificial, sustentado por estímulos pontuais e setoriais, sem base sólida a longo prazo?
Dentre os principais vetores desse crescimento estão o agronegócio e a forte injeção de recursos públicos, especialmente por meio de benefícios sociais e pagamentos de precatórios. Mas o que esses dados escondem?
Índice
ToggleAgropecuária: Motor Econômico Concentrado e Vulnerável
Em 2023, a agropecuária brasileira cresceu impressionantes 15,1%, contribuindo decisivamente para o crescimento de 2,9% do PIB nacional, de acordo com dados do IBGE. Sem esse desempenho, o crescimento teria sido tímido, na casa de 1,6%. Isso revela uma dependência preocupante: sem o agro, a economia brasileira patinaria.
Contudo, é fundamental destacar que esse setor, embora expressivo no PIB, não é inclusivo em termos de geração de emprego e distribuição de renda. A maior parte dos lucros permanece nas mãos de grandes conglomerados, enquanto pequenas e médias propriedades rurais enfrentam dificuldades crescentes com crédito, acesso à tecnologia e infraestrutura.
Além disso, o setor é altamente vulnerável às condições climáticas, o que se evidenciou em 2024. O IBGE registrou uma retração de 3,2% na agropecuária no primeiro trimestre do ano devido a eventos climáticos extremos, como estiagens severas, chuvas fora de época e temperaturas anormais. Essa queda mostra como uma base de crescimento fundamentada quase exclusivamente no agronegócio é arriscada.
E há mais: o crescimento agrícola tem gerado efeitos ambientais danosos, como desmatamento, uso intensivo de agrotóxicos e contaminação de recursos hídricos, o que compromete a sustentabilidade ambiental do país. A pergunta é inevitável: até quando o Brasil poderá depender de um setor que cresce em detrimento do meio ambiente e com benefícios sociais tão restritos?
Gastos Públicos: Estímulo Econômico ou Risco Fiscal?
Outro motor do crescimento tem sido a injeção massiva de recursos públicos, principalmente através de programas sociais como o Bolsa Família, a valorização real do salário mínimo e os pagamentos de precatórios. Essas ações colocaram dinheiro diretamente na mão do consumidor, o que impulsionou o consumo das famílias — este cresceu 4,8% em 2024.
Só os precatórios — dívidas judiciais que o governo federal é obrigado a pagar — injetaram R$ 131 bilhões na economia no final de 2023 e início de 2024, o equivalente a 1,1% do PIB. Mas, ao mesmo tempo, contribuíram para um déficit primário de R$ 230,5 bilhões no ano, segundo o Tesouro Nacional.
Esses estímulos, embora tenham efeito positivo de curto prazo, levantam preocupações sérias. O crescimento baseado em aumentos pontuais de consumo financiados por gastos públicos não é sustentável. Além disso, o Brasil já enfrenta desafios fiscais importantes, como o aumento da dívida pública, que ultrapassa os 75% do PIB.
A médio e longo prazo, essa prática pode comprometer a capacidade do governo de investir em áreas estruturais — como educação, infraestrutura e inovação — justamente aquelas que promovem crescimento duradouro.
O Consumo das Famílias: Crescimento Real ou Momentâneo?
O consumo das famílias representa mais de 60% do PIB brasileiro. Quando cresce, impulsiona toda a cadeia econômica: comércio, serviços, indústria. Mas o aumento recente está mais atrelado à injeção direta de dinheiro público, e não a ganhos estruturais de produtividade ou aumento sustentável da renda.
Essa dinâmica é perigosa porque cria a ilusão de um crescimento sólido, quando na verdade estamos vendo os efeitos de uma economia sustentada por “muletas fiscais”. Quando esses recursos cessarem — e isso ocorrerá, cedo ou tarde, pela pressão fiscal — haverá uma desaceleração abrupta do consumo.
E os Investimentos?
Outro ponto de alerta é a queda na formação bruta de capital fixo, ou seja, o volume de investimentos em infraestrutura, máquinas e equipamentos. Sem investimento, não há modernização da economia, nem aumento da produtividade.
Apesar do consumo em alta, o investimento permanece estagnado. E isso indica falta de confiança dos empresários e investidores quanto ao futuro do país. Uma economia que cresce pelo consumo, mas não pelo investimento, corre o risco de se esgotar rapidamente.
A Pergunta Central: Qual o Brasil Que Está Crescendo?
Diante desse cenário, a pergunta que deve ser feita é: quem realmente se beneficia com o crescimento atual do PIB?
- O setor agroexportador, que envia commodities para o exterior, gera lucros bilionários, mas emprega pouco e impacta o meio ambiente?
- Os grandes grupos econômicos, que acessam financiamento subsidiado e conseguem navegar em meio à instabilidade fiscal?
- Ou o trabalhador comum, cuja renda segue pressionada pela inflação, pela informalidade e pelo aumento do custo de vida?
O crescimento que exclui grande parte da população, aprofunda desigualdades e compromete o futuro fiscal não pode ser celebrado sem críticas. Ao contrário, deve servir de alerta para a urgência de políticas públicas mais equilibradas, voltadas à diversificação econômica, ao fomento de inovação e tecnologia e à redução da desigualdade social.
O Que Esperar dos Próximos Anos?
Se o Brasil quiser crescer de forma sólida e sustentável, precisará romper com o modelo atual, baseado na dependência do agro e na expansão de gastos públicos. Será necessário:
- Diversificar a economia, fortalecendo a indústria, a tecnologia e os serviços de valor agregado;
- Estabilizar as contas públicas, equilibrando responsabilidade fiscal e políticas sociais eficientes;
- Investir em educação, inovação e infraestrutura, com foco na produtividade de longo prazo;
- Fortalecer instituições, garantir segurança jurídica e melhorar o ambiente de negócios.
Sem isso, continuaremos presos ao ciclo de crescimento ilusório: avanço pontual seguido por estagnação ou recessão.
Considerações Finais
O crescimento do PIB, quando não acompanhado de inclusão, sustentabilidade e planejamento estratégico, torna-se um número vazio. É preciso olhar além das estatísticas e entender o tipo de desenvolvimento que queremos construir.
É preciso investigar suas origens, seus impactos e sua sustentabilidade. Crescer com base em setores voláteis e em gastos públicos temporários pode gerar alívio momentâneo, mas não resolve os problemas estruturais do Brasil.
Para avançar de forma consistente, é necessário construir uma economia mais diversificada, inovadora, justa e resiliente. Caso contrário, continuaremos presos ao ciclo de euforia e frustração, sem garantir progresso verdadeiro para a maioria da população brasileira.