Por Maria Clara Britto
No Brasil, a possibilidade de preservar a fertilidade antes de iniciar tratamentos agressivos como quimioterapia ou radioterapia ainda se restringe a uma parcela privilegiada da população. Apesar dos avanços científicos que permitem o congelamento de óvulos, espermatozoides e tecido ovariano, abrindo a perspectiva da maternidade ou paternidade após o tratamento do câncer, os altos custos e a ausência de políticas públicas consistentes acentuam a disparidade de acesso.
Embora o Superior Tribunal de Justiça tenha determinado que planos de saúde cubram a criopreservação de óvulos para pacientes oncológicos, essa proteção tem suas limitações. A cobertura se estende até o término da quimioterapia, sendo os custos de manutenção subsequentes de responsabilidade da paciente.
Na rede pública, o acesso é ainda mais restrito. Tratamentos reprodutivos em geral não são amplamente contemplados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pelos planos de saúde, dificultando o acesso da maioria dos pacientes. Iniciativas como o programa “Os Frutos da Vida”, do IPGO, oferecem atendimento gratuito e acompanhamento médico, dependendo de parcerias para minimizar custos com medicamentos e insumos. Contudo, a paciente precisa arcar com as despesas de medicação e exames laboratoriais.
Em contraste, diversos países têm consolidado políticas públicas que reconhecem a preservação da fertilidade como parte integrante do cuidado oncológico. No Reino Unido, o NHS England inclui a preservação da fertilidade em sua rede de atendimento, garantindo que pacientes jovens diagnosticados com câncer sejam informados e encaminhados para essa opção quando houver risco de infertilidade. A França, por meio da seguridade social, reembolsa procedimentos de autoconservação de gametas e tecidos reprodutivos por motivo médico, como antes da quimioterapia.
Nos Estados Unidos, a cobertura varia por estado, com alguns garantindo algum nível de cobertura para preservação da fertilidade em pacientes oncológicos. O Canadá apresenta um modelo de cobertura provincial desigual, com Quebec oferecendo a preservação da fertilidade integralmente pelo sistema público.
Diante deste cenário, especialistas apontam para a importância do encaminhamento precoce para o serviço de preservação da fertilidade, o que contribui para o sucesso do tratamento sem atrasar a terapia oncológica. Preservar a fertilidade, além de congelar gametas, representa uma forma de dar esperança em meio ao diagnóstico. Pacientes relatam que se sentem mais fortes ao proteger não apenas sua saúde, mas também o sonho de um futuro familiar.
Fonte: jornaldebrasilia.com.br