Sumário
ToggleA crescente demanda por eletricidade impulsionada pelas centrais de processamento de dados de inteligência artificial tem provocado uma reavaliação estratégica na infraestrutura energética dos Estados Unidos, especialmente no que tange às usinas de geração de eletricidade de pico. Em Chicago, no bairro operário de Pilsen, um complexo industrial com usinas a óleo, datado da década de 1960, localizado atrás do Dvorak Park, exemplifica essa tendência. A Usina Fisk, composta por oito unidades e pertencente à NRG Energy, que estava originalmente programada para desativação no próximo ano, teve seu aviso de aposentadoria suspenso. Esta decisão é um reflexo direto da pressão exercida pela necessidade energética das operações de IA, que superou a oferta disponível no maior mercado de energia do país, a interconexão PJM, abrangendo treze estados.
Essa mudança de planos para a Usina Fisk não é um evento isolado, mas sim parte de um movimento mais amplo onde geradores de pico estão sendo incentivados a permanecerem ativos nas redes elétricas norte-americanas. Conforme declarou Matt Pistner, vice-presidente sênior de geração da NRG, a manutenção das oito unidades geradoras da Fisk é justificada economicamente pela nova realidade do mercado. As usinas de pico são projetadas para operar em curtos intervalos, especificamente durante períodos de máxima demanda de energia, funcionando como uma salvaguarda para prevenir interrupções no fornecimento. No entanto, essa estratégia apresenta desafios significativos, pois muitas dessas instalações possuem décadas de operação, utilizam combustíveis fósseis e, consequentemente, liberam mais poluentes. Além disso, a eletricidade que produzem tende a ser mais cara em comparação com a gerada por usinas de operação contínua.
Uma análise de registros da maior rede de energia do país, a PJM, revelou que aproximadamente 60% das termelétricas a óleo, gás e carvão que tinham planos de desativação na região adiaram ou cancelaram tais iniciativas ao longo do ano. A maioria destas unidades que evitaram o fechamento são justamente as usinas de pico. A Usina Fisk, em particular, foi erguida sobre o terreno de uma antiga usina a carvão que operou por mais de um século antes de ser desativada, há mais de uma década, após forte oposição da comunidade local. Embora o encerramento da usina a carvão tenha resultado em uma diminuição significativa da poluição na área, as oito unidades a óleo continuaram a operar, e agora seu uso tende a se intensificar. Moradores como Jerry Mead-Lucero, um ativista de longa data em Pilsen, expressaram desapontamento com a continuidade da produção de energia no local, mesmo após o fechamento da unidade a carvão. A Agência de Proteção Ambiental dos EUA registrou que as emissões de dióxido de enxofre no local variaram entre 2 e 25 toneladas anuais, uma quantidade que Brian Urbaszewski, Diretor de Programas de Saúde Ambiental da Respiratory Health Association, considera relevante para as residências vizinhas.
O design das usinas de pico, priorizando a velocidade sobre a eficiência, implica que muitas delas não possuem sistemas de controle de poluição. Equipamentos como depuradores de mercúrio ou filtros para material particulado, que são cruciais para a redução de emissões tóxicas, são frequentemente ausentes. A altura reduzida das chaminés em algumas dessas instalações, apontada por defensores ambientais, contribui para uma concentração maior de poluentes nas comunidades adjacentes. A administração do presidente Donald Trump já sinalizou interesse em explorar a capacidade ociosa de fontes de energia existentes, incluindo as usinas de pico, para responder à nova e massiva demanda por eletricidade. O Secretário de Energia dos EUA, Chris Wright, mencionou em entrevista que há um potencial considerável para aumentar a operação de tais usinas, argumentando que as regulamentações de ar limpo limitam seu funcionamento. Ele destacou que a capacidade ociosa da rede elétrica representa um alvo principal para a expansão energética. Embora as usinas de pico respondam por cerca de 3% da energia gerada nos EUA, elas detêm a capacidade de produzir até 19% do total, conforme um relatório do U.S. Government Accountability Office (GAO).
A reativação e intensificação do uso dessa capacidade ociosa, contudo, levanta preocupações ambientais e sociais, especialmente porque as comunidades próximas a essas usinas, muitas vezes, já enfrentam uma carga ambiental desproporcional. Estudos acadêmicos e governamentais indicam que as cerca de mil usinas de pico no país estão predominantemente situadas em comunidades de baixa renda. Uma pesquisa de 2022, focada em comunidades norte-americanas historicamente “relegadas” devido à segregação racial ou de imigrantes, revelou que os moradores dessas áreas possuem uma probabilidade 53% maior de ter uma usina de energia construída nas proximidades desde o ano 2000, em comparação com áreas não relegadas. Lara Cushing, professora de ciências da saúde ambiental na UCLA e líder do estudo, sublinhou que essa relação é ainda mais pronunciada para as usinas de pico.
A maioria das usinas de pico nos EUA foi construída em dois momentos de expansão do consumo de energia: em meados do século XX, com a popularização de eletrodomésticos, e na virada do milênio, com o crescimento econômico e a ascensão dos computadores. Posteriormente, a eficiência energética de dispositivos e infraestruturas resultou em uma redução da demanda, levando ao fechamento de muitas usinas a combustíveis fósseis e à ascensão de parques solares e eólicos. Frank Rusco, diretor do GAO, que conduziu um estudo sobre o uso dessas usinas a pedido de grupos de justiça ambiental, observou que o sistema antigo está sendo solicitado a trabalhar mais, justificando o aumento no uso de geradores de pico. O estudo do GAO também revelou que as usinas de pico movidas a gás natural emitem, em média, 1,6 vez mais dióxido de enxofre por unidade de eletricidade produzida, quando comparadas às usinas tradicionais.
A Usina Fisk integra a Interconexão PJM, a maior rede elétrica do país, que se estende por treze estados e engloba a maior concentração global de data centers. A crescente demanda dessas instalações está colocando uma pressão significativa sobre as reservas de energia da rede e já resultou em elevações substanciais nos preços da eletricidade. Os valores pagos aos fornecedores de energia na PJM para garantir a operação das usinas em momentos de demanda máxima aumentaram mais de 800% no último verão em relação ao ano anterior, tornando a posse de usinas de pico consideravelmente mais lucrativa. Jeff Shields, porta-voz da PJM, enfatizou que a demanda de eletricidade nacionalmente está superando a oferta, e o mercado está reagindo a isso. Ele reiterou a necessidade de manter a geração existente e adicionar nova capacidade para atender às necessidades dos data centers e outras cargas econômicas.
De acordo com uma análise da Reuters, que se baseou em cartas enviadas à PJM por empresas de energia, cerca de 23 usinas a petróleo, gás e carvão na área da PJM estavam programadas para serem aposentadas a partir de 2025. Contudo, desde o início do ano, empresas de energia, o operador da rede e o governo federal adiaram ou cancelaram a desativação de 13 dessas usinas, sendo 11 delas unidades de pico. Entre as que tiveram o fechamento adiado estão as unidades de aproximadamente 55 anos da usina Eddystone, perto da Filadélfia, de propriedade da Constellation Energy, que receberam ordens do Departamento de Energia para continuar operando. A usina Wagner, uma unidade de pico próxima a Baltimore, foi mantida em funcionamento a pedido da PJM. Muitas dessas usinas retidas foram construídas como geradores de pico, enquanto outras, inicialmente projetadas para operação contínua, foram rebaixadas para funcionar apenas em emergências.
A NRG Energy, proprietária da Fisk, argumenta que as usinas de pico são uma “última linha de defesa” essencial para a rede elétrica. Elas são cada vez mais solicitadas não apenas para suprir os data centers, mas também para a eletrificação da manufatura e do transporte, e para mitigar apagões causados por eventos climáticos extremos, como tempestades de inverno e ondas de calor. A presença das unidades de pico da Fisk em Chicago significa que a cidade não precisa importar eletricidade em situações de emergência, especialmente quando fontes externas falham. Matt Pistner, da NRG Energy, ressaltou que, quando essas usinas são necessárias, não há alternativas imediatas. A NRG, que possui um portfólio diversificado de fontes de energia, desde nuclear até eólica e solar, considera as usinas de pico a óleo como um reforço à segurança energética, pois o combustível pode ser armazenado no local. Um porta-voz da NRG afirmou que a usina opera consistentemente dentro das regulamentações ambientais federais e estaduais, destacando seu histórico.
Especialistas em energia apontam para alternativas viáveis às usinas de pico. Investimentos em linhas de transmissão mais robustas poderiam facilitar o transporte de eletricidade de regiões com excesso de oferta para aquelas com déficit, tornando o sistema mais eficiente e, consequentemente, reduzindo a dependência dessas usinas, conforme observou Frank Rusco, do GAO. As baterias, que estão em constante aprimoramento tecnológico para armazenamento de energia por períodos mais longos, também representam uma solução promissora para substituir muitas unidades de pico, segundo defensores da energia limpa. No entanto, com a escalada da demanda de energia pela IA, comunidades como Pilsen, que no passado obtiveram sucesso na luta contra fontes de poluição, podem enfrentar maior dificuldade em seus esforços para combater a continuidade das usinas de pico. John Quigley, do Kleinman Center for Energy Policy da Universidade da Pensilvânia, alertou que essa situação resultará em aumentos significativos de custos para os consumidores de eletricidade e na elevação da poluição local, além de dificultar a integração de novas fontes de energia limpa na rede. A PJM, por sua vez, garantiu que continuará a conectar energia renovável, nuclear e a gás à rede, independentemente da longevidade das usinas de pico. Jeff Shields, da PJM, reiterou a urgência de dispor de toda a capacidade energética possível, descrevendo a desativação de usinas existentes como uma ignorância da realidade atual. O norte de Illinois, incluindo áreas próximas a Pilsen, está se consolidando como um mercado de data centers em expansão, com novos projetos de uso intensivo de energia em planejamento, como um campus de 20 edifícios anunciado pela T5 Data Centers. Jerry Mead-Lucero expressa sua preocupação de que as unidades de pico da Fisk perpetuem o histórico de riscos ambientais de sua cidade natal, que já sofre com emissões de tráfego de caminhões, um reciclador de metais e uma rodovia de grande porte que atravessa a comunidade.
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Perguntas Frequentes sobre Usinas de Pico
O que são usinas de pico e qual sua função principal?
As usinas de pico são instalações de geração de energia elétrica projetadas para operar em rajadas curtas durante períodos de alta demanda. Sua função principal é complementar a oferta de energia e evitar apagões, fornecendo eletricidade rapidamente quando o consumo excede a capacidade das usinas de base.
Por que a demanda por inteligência artificial está afetando as usinas de pico?
A expansão acelerada das centrais de processamento de dados para inteligência artificial requer uma quantidade massiva de eletricidade. Essa demanda crescente está superando a oferta existente em muitas regiões, tornando as usinas de pico, que podem ser ativadas rapidamente, essenciais para equilibrar a rede elétrica e manter o fornecimento.
Quais são as principais desvantagens das usinas de pico?
As principais desvantagens incluem a utilização frequente de combustíveis fósseis, que resultam em maiores emissões de poluentes atmosféricos como dióxido de enxofre e material particulado. Além disso, por serem construídas para velocidade e não eficiência, geralmente carecem de controles de poluição avançados, e a eletricidade que produzem tende a ser mais cara do que a gerada por usinas de base. A localização desproporcional em comunidades de baixa renda também levanta questões de justiça ambiental.
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Fonte: https://www.infomoney.com.br

















