Superdotação: desafios, impactos na rotina familiar e as dificuldades no sistema educacional

O diagnóstico de superdotação pode transformar completamente a rotina de uma família, trazendo desafios que vão além do desempenho acadêmico. Essa realidade foi retratada no programa Profissão Repórter de terça-feira (25/02), que acompanhou a história da advogada Adelita Andressa Carvalho e seus três filhos, todos diagnosticados como superdotados.

Apesar do estereótipo de que pessoas com altas habilidades são sempre bem-sucedidas e não enfrentam dificuldades, Adelita destaca que a trajetória de um superdotado pode ser repleta de obstáculos, especialmente quando o suporte adequado não é oferecido.

“Demorou muito para a gente entender as características. A gente se percebe diferente, mas existe um mito de que o superdotado é ‘perfeito’, que ele é bom em tudo que faz, que tudo realiza com maestria, e isso não é verdade”, explica Adelita.

Desafios na escola: adaptação e saúde mental

Um dos maiores desafios enfrentados por superdotados é a adaptação ao sistema educacional tradicional, que muitas vezes não está preparado para lidar com alunos com altas habilidades. Esse é o caso de Heloisa, de 9 anos, filha de Adelita, que está no quarto ano do ensino fundamental, mas tem dificuldades para frequentar a escola presencialmente.

“No dia em que eu voltei para a escola, comecei a passar mal. Senti muita ansiedade e tremedeira nas pernas”, conta a menina.

Há um ano, por recomendação médica, Heloisa deixou de frequentar as aulas presenciais devido ao impacto emocional que sofria. Como alternativa, os professores enviam o material didático para que ela estude em casa, e uma vez por semana, ela vai até a Secretaria de Educação para entregar as lições.

Para garantir esse acompanhamento, Adelita precisou lutar pelo direito da filha a uma educação adaptada. “Tive que conversar com a escola, capacitar a equipe, trazer profissionais para explicar as necessidades dela. O suporte para superdotados ainda é muito precário”, relata.

A neuropsicopedagoga clínica Olzeni Ribeiro destaca que, sem apoio adequado, o impacto na saúde mental dos alunos pode ser grave.

“Os pais muitas vezes precisam escolher entre a saúde mental e física dos filhos ou o diploma escolar. A sobrecarga é tão grande que muitos acabam adoecendo”, alerta.

Impactos psicológicos: quando a genialidade se torna um fardo

O caso de Matheus Carvalho, irmão mais velho de Heloisa, exemplifica como a superdotação pode ser mal compreendida e levar a diagnósticos equivocados. Hoje com 22 anos e estudante de engenharia mecânica, ele encontrou na tecnologia e na modelagem 3D uma paixão. No entanto, sua jornada foi marcada por dificuldades emocionais.

“Aos 13 anos, eu não conseguia mais sair de casa. Comecei a ter crises de pânico muito fortes na sala de aula”, lembra Matheus.

Sem um diagnóstico preciso na época, ele passou por diversos especialistas, que inicialmente levantaram suspeitas de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno do espectro autista (TEA), transtorno desafiador opositivo (TDO), transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e até mesmo bipolaridade.

Segundo especialistas, a superdotação pode ser confundida com outros transtornos psicológicos e comportamentais, o que dificulta um diagnóstico adequado.

“A identificação da superdotação é muito complexa, pois muitos dos comportamentos se assemelham a sintomas de transtornos. O diagnóstico exige uma análise profunda da história de vida da criança ou do adolescente”, explica Olzeni Ribeiro.

No Brasil, a falta de reconhecimento da superdotação ainda é um problema. De acordo com a especialista, há uma grande subnotificação de casos.

“Hoje, o sistema de ensino brasileiro reconhece apenas cerca de 38 mil alunos superdotados. No entanto, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), o número real deveria ser de, no mínimo, 4 milhões”, alerta.

Matheus destaca que o apoio da família foi essencial para sua recuperação. “Fui me recompondo aos poucos, sem saber ainda que era superdotado. Com muita ajuda dos meus pais, consegui retornar à escola e me encontrar na engenharia”, afirma.

Superdotação no Brasil: um talento invisível?

Apesar de a superdotação estar presente em aproximadamente 5% da população, segundo a OMS, muitos alunos passam despercebidos no ambiente escolar. A falta de capacitação dos professores e a ausência de políticas públicas efetivas dificultam o desenvolvimento dessas crianças e jovens.

Além disso, o modelo tradicional de ensino nem sempre oferece desafios intelectuais compatíveis com o ritmo de aprendizado acelerado dos superdotados, levando a problemas como desmotivação, ansiedade, isolamento social e, em alguns casos, até evasão escolar.

A história da família de Adelita exemplifica os desafios diários que pais e alunos enfrentam para garantir um ambiente adequado ao desenvolvimento dessas habilidades. Sem suporte especializado, muitos superdotados acabam sendo tratados como crianças “difíceis” ou “desobedientes”, quando, na verdade, apenas precisam de um ensino diferenciado e acolhedor.

Diante desse cenário, especialistas reforçam a necessidade de políticas públicas voltadas à identificação precoce e ao acompanhamento adequado desses alunos, garantindo que seus talentos sejam valorizados e desenvolvidos, em vez de se tornarem um fardo.

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